A febre do ouro não é uma doença, mas é como se fosse. O sujeito fica vidrado pela ideia de achar uma pepita e enriquecer de uma hora para outra. Vítimas da febre largam família e emprego para correrem atrás de sua obsessão. Na busca da fortuna, se submetem a tudo: ambientes inóspitos, doenças tropicais e a vizinhança da morte ao mergulharem em rios sem visibilidade ou à tóxica convivência com o mercúrio, usado para separar o ouro.
A corrida do ouro mais famosa foi a do Klondike, no Alasca, no fim do século XIX. Depois que notícias da descoberta chegaram a San Francisco, em 1896, mais de 100 mil garimpeiros se aventuraram no Yukon, onde enfrentavam lama, frio glacial e pistoleiros. Estima-se que apenas 3 mil encontraram alguma pepita, e poucas centenas enriqueceram. O restante viveu uma saga de misérias, porque a febre do ouro é assim – uma grande ilusão que muitas vezes só aprofunda a própria desgraça.
Aos 28 anos, o jovem tenente Jair Bolsonaro não podia imaginar que um dia chegaria à Presidência da República, mas sonhava com a fortuna do garimpo. No início dos anos 80, após se embrenhar no interior de Saúde, na Bahia, sua ficha na Diretoria de Cadastro e Avaliação do Exército anotava que o oficial dera “mostras de imaturidade ao ser atraído para empreendimento de garimpo de ouro”. Registrava ainda que o tenente demonstrava “excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente”. Bolsonaro foi levado ao Conselho de Justificação do Exército, onde seu superior, o coronel Carlos Alfredo Pellegrino, relatou que tentara fazê-lo desistir, sem sucesso, do garimpo e que havia identificado “sua grande aspiração em poder desfrutar das comodidades que uma fortuna pudesse proporcionar”.
Em entrevistas, o já deputado contou que carregava bateia e peneiras no porta-malas do carro e às vezes estacionava ao lado de um rio para tentar faiscar – achar uma pepita. Dizia ainda que o garimpo estava no sangue. De fato, seu pai, Percy, foi um dos 100 mil garimpeiros de Serra Pelada no auge da mina, pelos idos de 1983. Dez anos mais tarde, como repórter de Zero Hora, conheci Serra Pelada ao lado do fotógrafo Ricardo “Kadão” Chaves. Embora a jazida já estivesse inundada e não detivessem mais o direito de lavra, milhares de garimpeiros seguiam por ali, obcecados pela fantasia de bamburrar – topar com uma grande pepita ou um veio de ouro.
Corta para a atualidade. Bolsonaro vira presidente do Brasil e nesta condição, e só por ela, recebe de presente de outros governos joias, relógios e objetos dourados impensáveis para um militar. Para quem tentou a vida inteira enriquecer no garimpo, despojar-se de seu veio de ouro não é fácil. A febre, recorde-se, é como uma doença. Bolsonaro presidente finalmente bamburrou, mas, como quase sempre ocorre nestas ocasiões, essa também pode ser a sua ruína.