
A Fifa abre neste sábado (14) o seu sonhado Mundial de Clubes no espetacular Hard Rock Café Stadium, em Miami Gardens. Ou seja, tudo convida para ser uma festa para o futebol (e os negócios que movem sua indústria).
Porém, o destino nem sempre aceita as imposições dos homens. A tabela coloca frente a frente Inter Miami e Al Ahly. O time da Flórida é tudo o que imaginamos quando falamos em negócios de futebol. Um clube jovem, de um mercado emergente e com projeto de marketing bem amarrado em Messi e seus amigos, dentro de campo, e David Beckham, o exemplo mais bem acabado de marketing no futebol, fora dele.
O Al Ahly é a antítese disso tudo. Não que o clube egípicio seja um modelo do futebol 1.0. Pelo contrário, como maior clube da África, sabe como se mover nessa indústria. O ponto que me refiro é que o Al Ahly é um clube com história, alma e raízes políticas. Sua torcida honrou na Primavera Árabe o nome do clube (O Nacional, na tradução). Os ultras do Al Ahly, os Ahlawy, tomaram a linha de frente nas manifestações de rua que derrubaram o ditador Hosni Mubarak no começo de 2011. A mobilização política, inclusive, criou uma união inédita entre as duas maiores torcidas do país, já que os ultras do Zamalek se misturaram com os Aalawy na dianteira das manifestações.
O engajamento não partiu apenas os torcedores. Mohamed Aboutrika, o maior ídolo da história do Al Ahly, apoiou as manifestações democráticas e apoiou o governo de Mohamed Morsi, eleito em 2012, encerrando uma ditatura de 30 anos. Por trás de Morsi, estava a Irmandade Muçulmana. Porém, em julho de 2013, Morsi foi deposto por um golpe militar que deu início à ditadura de Abdel Fatah al-Sissi. Aboutrika foi incluído na lista de terroristas por Sissi, teve bens congelados em 2015 e se exilou no Catar.
A nova ditadura também não se esqueceu de cobrar a conta dos Ahlawys pela ação na Primavera Árabe. O saldo foi a maior tragédia do futebol egípcios. Em fevereiro de 2012, o Al Ahly foi enfrenta o Al-Masry, em Port Said. A torcida do Masry atacou a do Al Ahly, diante da complacência das forças policiais. A batalha acabou com 74 mortos, sendo 72 deles dos visitantes.
Esse peso da história é que estará em campo nesta noite, contra Messi, em um encontro de mundos e culturas tão distantes que só um Mundial pode nos proporcionar.