
Juro que não pretendia escrever sobre isso, mas não deu. Os tais "bebês reborn" viraram o assunto do momento, mais do que as guerras, a gripe aviária, as doideiras do Trump e as mudanças climáticas. Eles são, oficialmente, a mais nova bizarrice inventada pela espécie humana para fugir da realidade.
As bonecas hiper-realistas que imitam recém-nascidos simbolizam exatamente isso: o último grito em escapismo para adultos que preferem viver em um mundo de faz-de-conta.
Não estou falando dos usos terapêuticos nem da arte por trás dos "reborn". As criações podem ser úteis, por exemplo, em casos de Alzheimer ou como suporte psíquico para mães enlutadas. Além disso, são, de fato, objetos artísticos raros, cuja origem é muito mais antiga do que a nova febre bizarra. Grandes artesãos criam há anos bonecas do tipo como objetos de colecionismo.
O problema é o uso que vem sendo feito delas. Adultos agindo como se fosse trivial criar bonecas como seres humanos, com direito a festinha de aniversário, roupinhas e passeio no parque? É demais. Nem com os Tamagotchi (lembra deles?) dos anos de 1990 chegamos a esse nível de niilismo.
A febre "reborn" é a substituição das relações reais por uma invenção. Tem a ver com solidão, carência, frustrações e desconexão com a realidade.
É mais fácil, afinal, ter em casa um desses seres perfeitinhos, asseados e inanimados (e ficar postando fotos e vídeos nas redes sociais), a ter de criar um bebê de verdade — que faz xixi, cocô, que chora e vomita, que cresce e vem todo o pacote que mães e pais reais conhecem muito bem, obrigada.
Por que adotar uma criança rejeitada ou maltratada pela família, se dá para comprar um desses bebês na internet pela bagatela de R$ 400? Se você procurar bem, já tem até promoção. Se quiser algo ainda mais realista, basta desembolsar R$ 15 mil. Pronto! Você pode entrar para o clube dos pais de boneca e viver nesse mundinho paralelo alienado, estéril e asséptico — ah, e cheio de "likes".