Depois de semanas de negociação, em um calorento fevereiro de 2014, Cleidi Pereira finalmente conseguiu: aos 26 anos, a então repórter de Zero Hora ouviu o "sim" do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi de São Paulo, e foi até Brasília entrevistá-lo.
Agora, mais de uma década depois, a jornalista radicada em Lisboa, Portugal, lança o livro Confissões de um torturador — A última entrevista do coronel Ustra (Editora Insular, 189 páginas), um documento histórico, angustiante e necessário.
O lançamento será no dia 22 de abril, na sede da Associação Riograndense de Imprensa, em Porto Alegre (leia os detalhes abaixo). Na ocasião, ela entregará o áudio da conversa a Jair Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos.
Escrita entre idas e vindas ao longo dos últimos seis anos, a obra aprofunda o conteúdo publicado em 2014 em ZH e traz novos elementos, com prefácio de Krischke e apresentação de Dione Kuhn, editora de Política de ZH à época.
Quis o destino que aquela fosse a derradeira entrevista do primeiro militar reconhecido como torturador pela Justiça brasileira. Ele morreria aos 83 anos, em 2015, vítima de falência múltipla de órgãos.
A conversa ocorreu na casa do oficial e teve o dobro do tempo do depoimento dele à Comissão Nacional da Verdade, em maio de 2013, quando Ustra se recusou a responder muitas perguntas sobre os horrores da ditadura civil-militar no Brasil. Diante da jovem repórter, ele fez revelações jamais feitas, nas entrelinhas e nas contradições de suas falas.
É preciso lembrar para que não se repita.
CLEIDI PEREIRA
Em entrevista à coluna
Ustra admitiu, por exemplo, a realização de "interrogatórios contínuos", sem que o preso pudesse descansar ou dormir, um método reconhecido de tortura. Ele admitiu algo que havia passado décadas negando.
Por que publicar isso agora? Cleidi, que decidiu elencar todas as vítimas de Ustra no livro, tem a resposta:
— É preciso lembrar para que não se repita, especialmente em tempos de flerte com o fascismo e quando vemos pessoas exaltando um torturador, inclusive um deputado federal que seria eleito presidente do Brasil. Como jornalista, eu precisava fazer isso.
Precisava mesmo.
Em 2014, eu dividia a mesa com Cleidi e vi tudo de perto: a persistência, o profissionalismo, os medos, as dúvidas. Como escreveu Nelson Rolim, editor da obra e diretor da Insular, há livros imprescindíveis e este, seguramente, é um deles.
Serviço

O quê: lançamento do livro Confissões de um torturador - A última entrevista do coronel Ustra, com sessão de autógrafos e painel com participação do Elmar Bones e Jair Krischke
Quando: dia 22 de abril, às 19h
Onde: na sede da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), na Avenida Borges de Medeiros, 915, 8º andar
Quanto: o evento é gratuito
Onde comprar o livro: por enquanto, o livro está disponível à venda no site da editora, clicando aqui