
"Eu sei que a vida devia ser bem melhor, e será. Mas isso não impede que eu repita: é bonita, é bonita e é bonita" (Gonzaguinha)
Convencidos de que vamos viver mais, parece muito adequado que nos preocupemos em dar sentido a esta prorrogação, qualificando-a.
Nos últimos anos, movidos por esta evidência, cada vez mais se considera a importância da qualidade de vida, ainda que este seja um conceito contaminado por quanto encerra de subjetividade. Se considerarmos que uma vida de boa qualidade é a que gera felicidade, já mergulharemos no imponderável: nada é mais heterogêneo do que o sentimento de felicidade.
Independentemente do que cada um considere como modelo, um elemento é indispensável em todos eles: a preservação da utilidade, o que tantas vezes conflita com a ideia de "aproveitar a vida" não fazendo mais nada. Dê a um velho uma função produtiva, e ele revigorará. Remova-a, e ele definhará consumido pela perda do sentido da vida.
Seguramente, a inércia programada ou imposta por alguma limitação física é a linha divisória entre a morte disfarçada em depressão e a vida útil do idoso saudável e bem-humorado. Neste último quesito, algum grau de deboche e ironia não só é tolerável, como altamente festejado.
O que é uma vida boa?
Em filosofia, se considera muito complexa a definição de vida boa, em função do quanto, felizmente, somos diferentes. Mas alguns componentes são imutáveis e usualmente mais percebidos pela ausência deles:
1) Ter uma família afetiva e calorosa. A prole bem-sucedida é um dos elementos mais importantes na construção de uma velhice feliz, enquanto repetidas frustrações nesta área contribuem, tristemente, para dar naturalidade à morte.
2) Planejar estabilidade financeira, que talvez seja, junto com solidariedade familiar, um dos fatores mais importantes quando se enfrenta a doença na velhice.
A inércia programada ou imposta por alguma limitação física é a linha divisória entre a morte disfarçada em depressão e a vida útil do idoso saudável e bem-humorado
3) Ler sem parar, ouvir música, cultuar a arte e ter amigos que façam outras coisas. Fugir da rotina é preservar a criatividade.
4) Amar muito e ter pena das pessoas que nunca se apaixonam.
5) Praticar a generosidade e, através dela, se deliciar com o mais nobre e impagável dos sentimentos humanos: a gratidão.
6) Ter uma vida pessoal e profissional dentro de padrões éticos, que sirvam de exemplos para os filhos, de fonte do respeito dos amigos e de resposta definitiva aos desafetos. Kant propõe que a verdadeira felicidade é o resultado de uma vida vivida de acordo com a moralidade e a dignidade humana. E uma vida digna, segundo ele, é a que entende que a moral da ética não consiste em buscar o que fazer para sermos felizes, mas no que fazer para merecermos a felicidade.