
Instalada no Senado com bastante barulho esta semana, a CPI do Crime Organizado só foi aprovada pelo clamor público suscitado pela megaoperação policial contra o Comando Vermelho, que resultou em 121 mortos no Rio de Janeiro na semana passada. E o que ela vai investigar? O alcance do domínio territorial das facções é um dos pontos principais, mas tem muito mais.
O relator da CPI, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), apresentou um plano de trabalho com nove itens:
- Estrutura e expansão de facções como PCC e CV e das milícias (formadas por policiais ou ex-policiais corruptos).
- Fontes de financiamento e lavagem de dinheiro por parte do crime organizado.
- Intersecção entre governo federal e os Estados no combate às facções.
- Domínio territorial e prisional pelas facções.
- Conexões regionais e transnacionais do crime.
- O poder da corrupção do crime organizado.
- Financiamento criminoso de candidaturas eleitorais.
- Atuação e possível infiltração de criminosos no poder público.
- Apontar mudanças legislativas necessárias.
A CPI deve funcionar por 120 dias e tem poucos pontos de consenso. Um deles, é a convocação de 11 governadores para depoimento (entre eles, Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul). Eles deverão descrever a situação do crime organizado em seus estados. Outra bandeira consensual entre esquerda e direita, por incrível que pareça, é o endurecimento da legislação penal. A divergência, como sempre, está nos detalhes e no foco.
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deseja mudanças pontuais. Para isso, acaba de enviar ao Congresso um projeto de Lei Antifacção, que prevê pena de reclusão de até 15 anos para quem participar de facção (será maior que o existente hoje, oito anos por integrar organização criminosa), para homicídios cometidos em nome de facção (viram crime hediondo, com cumprimento da maior parte da pena em regime fechado) e aumento da pena para quem usar arma de guerra (como o fuzil).
A direita engrossa o caldo e acaba de aprovar pena de reclusão até 12 anos para quem conspirar ou atentar contra agentes que investigam o crime organizado.
O endurecimento da legislação conta inclusive com apoio do presidente da CPI, Fabiano Contarato (PT). Embora a base do governo tenha dúvidas se prisão é o melhor caminho contra o crime, ele é delegado da Polícia Civil e têm defendido mais rigor. Por exemplo: votou contra as chamadas 'saidinhas' (saída de apenado do presídio para visitar familiares) porque considera injustificável a quantidade de benefícios já concedidos aos condenados criminalmente. "Esses benefícios reforçam, para muitas famílias, o sentimento de impunidade", justificou o petista.
Apesar dos pontos de convergência, governistas e oposicionistas divergem muito em vários aspectos. Um deles é a adoção de Garantias da Lei e da Ordem (GLO) contra o crime organizado. Elas permitiriam envio de tropas e congelamento de áreas conflagradas, mas são vistas com desconfiança pelo governo Lula, embora preconizadas pela oposição de direita para questões como o domínio territorial criminoso no Rio.
Outra divergência é quanto à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF das Favelas), ajuizada no Supremo Tribunal Federal em 2019 e que questiona a violência policial em operações nas comunidades do Rio de Janeiro. A regra busca estabelecer diretrizes para reduzir a letalidade policial e foi classificada como "maldita" pelo governador fluminense Cláudio Castro (PL), por "dificultar o acesso de policiais às comunidades".
A direita também quer classificar as facções criminosas como "grupos terroristas", algo com que a esquerda não concorda. O duelo deve começar neste mês e se estender até 2026, ano eleitoral.
Uma ligeira vantagem está com o governo, que conseguiu a presidência da CPI e maioria (seis dos 11 integrantes). Após instalação e breve recesso, a Comissão deve iniciar para valer dia 18. Resta ver se vai gerar propostas objetivas e não apenas factoides.




