
A Polícia Civil do Rio de Janeiro divulgou o perfil dos 121 pessoas mortas na mais letal ação policial da história brasileira, realizada há uma semana nos Complexos do Alemão e da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro. Quatro eram policiais civis ou militares. Dos demais 117, 59 tinham mandado de prisão pendente e 97 tinham histórico criminal. Um grupo de 17 não apresentava ficha policial, mas o levantamento ressalta que 12 deles tinham indícios de participação no tráfico. Isso porque, via de regra, posavam em suas redes sociais com armas e/ou drogas à venda. É possível que os cinco restantes sejam inocentes pegos em fogo cruzado ou simplesmente não tinham hábito de aparecer cometendo crimes.
De qualquer forma, fica claro que a maioria absoluta dos mortos têm provável envolvimento com o tráfico, o que reforça o discurso do governo do Rio de que a Operação Contenção (nome dado à incursão mortífera) foi um sucesso. De quebra, reforça uma plataforma eleitoral que prega rigidez absoluta contra o crime organizado. A ação colheu mais aplausos do que críticas, mostram pesquisas de opinião divulgadas após o episódio.
Chama a atenção que, de acordo com o levantamento da Polícia Civil, 54% dos mortos na operação eram de fora do Rio. A lista que 62 dos "neutralizados" (esse é o termo usado) são de outros 11 estados: 19 do Pará, nove do Amazonas, 12 da Bahia, quatro do Ceará, dois da Paraíba, um do Maranhão, nove de Goiás, um de Mato Grosso, três do Espírito Santo, um de São Paulo e um do Distrito Federal. Entre eles, chefes de quadrilhas regionais. Só moradores do Sul não estão na lista macabra.
A se julgar pelo perfil dos mortos, o Comando Vermelho montou no Rio uma verdadeira força nacional do crime. Alguns dos bandidos forasteiros, conforme investigação policial e relatos de moradores, atuavam em home-office, gerenciando virtualmente, desde as favelas do Rio, operações criminosas em seus estados. Aí incluída venda de drogas e ordens para matar rivais.
O refúgio de criminosos organizado pelo CV nos complexos do Alemão e da Penha me lembra um outro santuário, montado pela guerrilha Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em seu país. Foi uma zona desmilitarizada criada durante as negociações de paz com o governo do presidente colombiano Andrés Pastrana (1998-2002). Essa área, que incluía a cidade de San Vicente del Caguán, abrangia uma vasta região de selva no sul do país, onde não havia presença do Exército ou da Polícia colombiana. Lá os guerrilheiros circulavam com armas e recebiam visitantes. Com o fracasso das negociações de paz, em 2002, o governo colombiano retomou a ofensiva militar e o controle da região, em ações que acompanhamos por Zero Hora, na época.
As pesquisas mostram que a maioria dos cariocas repudia o domínio do tráfico nas favelas. Resta saber o que fazer com milhares de desempregados que vivem nelas (os complexos do Alemão e da Penha têm 110 mil moradores, a maioria não envolvidos com crimes). O governador fluminense Cláudio Castro (PL) não entrou nesse debate sobre como evitar que os jovens sejam atraídos para o tráfico. E parece que não vai entrar. A ideia é faturar politicamente com seu apoio à CPI do Crime Organizado, que será instalada nesta terça-feira no Senado.




