
Impossível começar o dia sem acessar a série de reportagens O Maníaco do Cassino, que estreia hoje em podcast, texto, rádio e vídeos em Zero Hora. Material produzido com esmero pelo colega Fábio Schaffner, um dos melhores textos do Brasil, agora entregue de forma multimídia, acompanhado de um time de fotógrafos, editores e radialistas.
E este revival sobre as muitas vítimas do matador de namorados que assombrou a maior praia do Rio Grande do Sul (maior do mundo, segundo os rio-grandinos) nos traz a memória de outros serial killers que ganharam renome em território gaúcho. O primeiro e talvez o mais famoso nem de longe foi o mais letal, mas sacudiu a Porto Alegre do século XIX: o Açougueiro da Rua do Arvoredo, José Ramos. Ex-policial, ele usava sua mulher, a húngara Catarina Palse, para seduzir e atrair homens até um casarão situado no centro da capital gaúcha (na atual Rua Fernando Machado). Lá, as vítimas eram roubadas, assassinadas e esquartejadas. Isso ocorreu entre 1863 e 1864.
Conforme a crônica policial da época, o casal se desfazia de partes dos corpos produzindo linguiças de carne humana, vendidas em um açougue da cidade. O próprio dono do estabelecimento teria sido também assassinado. Acionada, a Polícia descobriu o endereço onde as vítimas tinham sido vistas por último, desenterrou restos de corpos e prendeu Ramos e Catarina. Ele foi condenado à prisão perpétua e morreu doente num hospital. Ela recebeu sentença de 13 anos de prisão e foi libertada em 1891. Virou o mais famoso caso do gênero e rendeu diversos livros.
Desde então o Rio Grande viveu duas guerras civis marcadas pela crueldade da degola, mas os matadores agiam por ideologia e mando, não por impulsos sádicos. Foi mais de um século após os crimes do linguiceiro que surgiu o Maníaco do Cassino. E mais de uma década após os crimes dele é que os gaúchos tomaram conhecimento de outro serial killer: um matador de crianças. Entre 2002 e 2004, o andarilho Adriano da Silva, ex-lutador de muay thai, estrangulou e abusou sexualmente de nove meninos, segundo as provas colhidas pela Polícia Civil. Diagnosticado com transtorno de personalidade antissocial, ele confessou ao todo 12 assassinatos, mas de alguns os corpos não foram encontrados. O assassino agiu em Passo Fundo, Sananduva, Soledade e Lagoa Vermelha. Condenado a 264 anos de reclusão, ele segue preso.
Cobri do início ao fim o caso de Adriano e dos demais serial killers que o sucederam na história gaúcha. Em 2013 foi a vez da Polícia Civil descobrir que uma série de mortes misteriosas de taxistas eram obra de uma mesma pessoa: Luan Barcelos da Silva. Ele assassinou com tiros na nuca seis motoristas de táxi em três dias. Três em Santana do Livramento (na Fronteira, onde viveu a infância e adolescência), e três em Porto Alegre, onde estava residindo. Ele foi preso após ser reconhecido por colegas das vítimas e ter sua trajetória rastreada. Definido como psicopata, criado numa família de taxistas, ele está condenado a 55 anos de prisão.
E no Natal de 2024 os gaúchos souberam que a ingestão de um bolo tinha provocado a morte de três pessoas em Torres (Litoral Norte) e sintomas de envenenamento em outras três. Todas de uma mesma família. A análise comprovou que o doce continha arsênico. Os policiais interrogaram os sobreviventes e descobriram que uma das suas familiares, Deise Moura dos Anjos, tinha problemas de relacionamento com os demais. Após interceptação de mensagens, comprovaram que ela tinha ameaçado alguns parentes do marido e adquirido arsênio (elemento químico base do arsênico) via internet. Agia de forma sorrateira, inclusive prestando solidariedade às vítimas quando elas adoeciam.
Deise foi presa e a exumação do corpo do sogro dela provou também que esse homem morreu devido à presença do mesmo veneno, que também foi encontrado no sangue do marido e do filho dela. A assassina serial morreu antes de confessar o crime: se suicidou dentro da prisão, em 2025. É a última de uma lista mórbida, que desafia os limites da tolerância e da compreensão humanas.