
O Interior registrou três vezes mais homicídios do que a Região Metropolitana em 2024, nos mostra detalhada reportagem do colega Vinícius Coimbra. Faz sentido. O garrote policial contra as facções, grandes responsáveis por assassinatos, é maior no entorno da Capital do que nos confins. Até por motivos óbvios, já que as mais populosas cidades estão na Grande Porto Alegre (com exceção de alguns polos regionais).
E é nesses polos regionais, como Santa Maria e Passo Fundo, que os assassinatos têm aumentado nos últimos tempos. Reflexo da interiorização das facções, possivelmente. Mas o importante é que o número de homicídios em geral vem diminuindo há quase uma década, o que se tornou até bandeira do governador Eduardo Leite, em suas pretensões para voos políticos mais altos.
Alguns especialistas atribuem a redução dos homicídios a uma suposta parceria das facções com órgãos de segurança, o que contribuiria para uma falsa sensação de redução do crime. Entendo o ponto de vista, mas vou rebatê-lo.
Em primeiro lugar, não é falsa a sensação de redução. É real. Após os 15 primeiros anos do milênio com ascenção de crimes sangrentos, o Rio Grande do Sul vive um declínio no número de homicídios, de latrocínios e até de feminicídios (embora esse delito tenha redução estatística bem menor). Isso se deve a um conjunto de providências, sintetizadas num protocolo de sete medidas de enfrentamento aos crimes violentos. São elas:
- Saturação da área do crime.
- Ações pontuais e responsabilização das lideranças por crimes.
- Operações especiais e de lavagem de dinheiro.
- Revistas em casas prisionais.
- Responsabilização de lideranças por homicídios.
- Transferências de líderes para penitenciárias estaduais.
- Transferências de líderes para penitenciárias federais.
Aí entra a segunda observação que faço: não há qualquer prova de acordo do aparato estatal com as facções criminosas. Se existir, que seja mostrada. O que está claro que há é a dissuasão, um aperto geral nos negócios tocados pelo crime e nas lideranças que resulta em convencimento, na marra. O chefe de quadrilha percebe que, se continuar ordenando mortes, a situação vai piorar para ele. Inclusive fisicamente: será enclausurado numa prisão de segurança máxima. O Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), por exemplo, proíbe até visitas íntimas.
Sabedor dessa situação e com suas finanças asfixiadas pela presença constante de policiais na sua área de domínio, o bandido prefere negociar - com os rivais no crime. Pactos de não agressão são firmados e a geopolítica do submundo começa a se mexer.
Existem policiais que negociam com bandidos? Claro. Mas isso é diferente de negociar como política de Estado.