
Mudar para não mudar foi a escolha do governo estadual ao anunciar na manhã desta sexta-feira (9) chuvosa a saída do chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré. Ele será substituído pelo subchefe, Heraldo Guerreiro, que agora terá como sub a delegada Adriana da Costa, que comandava o Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), nevrálgico por lidar com as áreas mais vulneráveis ao crime organizado no Rio Grande do Sul.
A amigos Sodré vinha manifestando o desejo de sair há meses, tanto pelo estresse no trabalho quanto pela sobrecarga ao cursar doutorado em Direitos Humanos, concluído ano passado. Mas a verdade é que foi exonerado pelo aumento de queixas de subordinadas com as quais vinha discutindo há semanas. Uma fórmula que sempre acaba mal para quem tem o dever de liderar e não apenas comandar.
A gota da água foi a espinafrada pública que ele deu nas delegadas da Mulher, após a divulgação pela repórter Adriana Irion, de ZH, de que 307 vítimas de maus-tratos por parte dos companheiros deixaram de formalizar a queixa em decorrência da demora para serem atendidas em delegacias de Porto Alegre. A cobrança de Sodré às policiais pelo vazamento desses dados foi testemunhada pelo repórter Carlos Rollsing, também de Zero Hora. O Chefe de Polícia dizia ser impossível saber se as vítimas deixaram de preencher a ocorrência pela vagarosidade no atendimento ou porque esfriaram a cabeça e resolveram pensar melhor, antes da ruptura definitiva com o marido.
O fato é que aí Sodré ganhou a antipatia de delegadas em geral e colheu críticas, à esquerda e à direita do espectro político. Ele já tinha aceitado dias atrás a demissão de uma outra colaboradora histórica, a delegada Vanessa Pitrez (chefe do Departamento Estadual de Investigações Criminais, o Deic), também em meio a uma discussão sobre performances profissionais.
Vanessa é muito ligada à ex-Chefe de Polícia e atual deputada estadual Nadine Anflor (PSDB), que não gostou do episódio e deixou isso claro para quem quisesse ouvir. Somou-se a essa discussão a outra, com as delegadas da Mulher, e Sodré foi exonerado. Ficou pouco mais de dois anos no cargo.
Melhores estatísticas da história
E qual a performance de Sodré como Chefe de Polícia? Justiça seja feita, os números no combate ao crime melhoraram ainda mais, na gestão dele. Os dois anos em que ele ficou no cargo, 2023 e 2024, são considerados os mais seguros da história do Rio Grande do Sul. O biênio teve o menor número de mortos em crimes violentos já medidos (aí incluídos homicídios, feminicídios, latrocínios e assaltos). Claro que grande parte do mérito vai também para a Brigada Militar, que atua direto no patrulhamento das ruas.
Em 2024 houve queda de 83% nos latrocínios, 54% em homicídios e 38% em feminicídios, por exemplo.
Mas gestão não se faz apenas com estatísticas. É preciso também política e bom trânsito interno.
Assume agora Heraldo Guerreiro, um dos mais experimentados policiais do Rio Grande do Sul. A carreira dele se consolidou no Litoral Norte, onde foi delegado regional várias vezes, ao longo de décadas. Depois foi chefe do Departamento de Polícia do Interior (DPI, que coordena todas delegacias fora da Região Metropolitana) e também subsecretário da Segurança Pública. Voltou à subchefia de Polícia Civil na gestão de Sodré, a convite desse. De perfil político conservador, é um linha dura contra o crime. Agora é torcer para que consiga manter a excelente performance alcançada até o momento.