
Nascido em Monte Belo do Sul, na Serra, onde se "respira uva", Lucas Manzoni Uliana não fugiu à regra. Aos 24 anos, acaba de ser eleito o melhor sommelier do Rio Grande do Sul. É o reconhecimento de um trabalho que começou a tomar forma quando tinha 17 anos e trabalhava em um restaurante da cidade. Em entrevista ao Campo e Lavoura da Gaúcha, o jovem contou um pouco da trajetória. Confira trechos.
Você sempre pensou em ser sommelier?
Minha primeira formação foi em gastronomia. Não escolhi sommelier na minha primeira formação. Depois da gastronomia, percebi que não era bem o ramo que gostaria de trabalhar. Fui para o ramo de drinks, de bartender, mixologista. Também percebi que não era muito a minha praia. E aí procurei a Associação Brasileira de Sommelier (ABS) Rio Grande do Sul, para fazer o curso de sommelier. Nasci em Monte Belo do Sul, onde a gente respira uva, dorme ouvindo as plantas crescerem e as uvas brotarem... Essa parte da sommelier, de trabalhar com vinhos está muito atrelada à minha cultura, à cultura do município. Acabei me apaixonando por esse ramo. Quando entra no mundo do vinho, não consegue mais sair, porque acaba se fascinando. Quanto mais busca conhecimento, mais conhecimento tem de buscar. Muitas regiões, países, uvas pra aprender. É um ramo bem empolgante.
Qual é o papel do sommelier e a diferença para o do enólogo?
Na legislação brasileira, consta que o sommelier é responsável pelo serviço do vinho, mas hoje sabemos que tem muito mais por trás desse serviço. Basicamente, a diferença do enólogo para o sommelier é que o enólogo vai se voltar à produção, à elaboração do vinho. Desde antes da colheita, o enólogo está por trás do plantio, do tratamento da uva nos parreirais, até a elaboração do vinho, até o engarrafamento. Eu digo que o engarrafamento do vinho para frente é trabalho do sommelier. Gosto de uma expressão que diz que o sommelier "dá palavras ao vinho". Quando o vinho sai da vinícola, tem aromas, sabores, mas não consegue se expressar. E o trabalho do sommelier é dar palavras ao vinho. Então, o sommelier está muito atrelado a essa parte da degustação, de sentir esses aromas do vinho e de passar o que tem a oferecer para o cliente, para o comercial. Porque, às vezes, as pessoas conseguem tomar o vinho, degustar o vinho, mas não conseguem sentir o que o vinho expressa ou o que o vinho tem para 'falar'. O sommelier tem muito essa função de ajudar as pessoas na escolha do vinho, seja em casa, seja no trabalho.
Que tipo de pergunta fazem com maior frequência sobre harmonização?
Basicamente, começam com 'ah, vou fazer um churrasco em casa, o que eu tomo com esse churrasco? Sabemos hoje que essa carne vermelha, muito consumida em churrasco, vai melhor com vinho tinto. Por conta da proteína, dos taninos, enfim. 'Comprei um vinho tinto, por exemplo, o que eu como com esse vinho tinto?' Aí você vai desde o produtor, sendo mais específico, porque generalizar o vinho é muito difícil, né? A cada local, terroir, solo, clima, muda 100% o vinho. Então, você tem de ir atrás de como é o local, de onde vem a uva, que é, de que região é, primeiro. Mas existem, por exemplo, termos gerais do que dá para ser consumido. Ah, peixe com vinho branco. Dá certo? Quase todas as vezes. Mas tem exceções. Mas por que dá certo, por exemplo? Aí carne com vinho tinto. Dá certo? Quase sempre dá certo. Mas nem todo vinho é igual, nem toda carne é igual. O bom é evitar generalizações.
Como percebe a evolução da produção da uva e dos vinhos nacionais em taça?
A elaboração de vinhos no Brasil, mais especificamente no Estado, que é onde começou a cultura, está em plena evolução. Se potencializou com a entrada de grandes importadoras e de grandes produtoras, marcas para o Estado. E, de alguns anos pra cá, 10, 15 anos, está aumentando muito em questão de qualidade. Sempre foi destacado para o vinho tinto, mas hoje o Estado está muito focado na elaboração de espumantes, por exemplo. Tanto é que, na minha opinião, a maioria dos principais produtos elaborados no Estado é o espumante. Dada a qualidade, o frescor, a acidez, a elegância... Se assemelhando muito a espumantes franceses. Porém vai muito além dos espumantes? Temos os vinhos brancos com muita boa qualidade, tintos, que sempre foram trabalhados bem e estão cada vez mais elegantes, rebuscados, com mais qualidade. E também o nosso moscatel, que acompanha 90% das casas brasileiras hoje. Eu, por exemplo, adoro moscatel. Hoje sofre um certo preconceito, dizem que o moscatel é o espumante de entrada, de quem não toma, não conhece vinho. Acho que nem preciso demonstrar que essa frase está errada, né? Mas está mudando. Esses preconceitos que existiam de vinho brasileiro ser ruim, ter pouca qualidade estão caindo com o tempo e sendo desmentidos com o tempo.