
Diferentemente da agricultura, o universo da pecuária carece de dados, disse Felipe Fabbri, analista de mercado e da cadeia de produção animal na Scot Consultoria, durante a 20ª Jornada Nespro, encerrada nesta quarta-feira (18), na Capital. Mas, afinal, o que isso quer dizer? Confira trechos da entrevista.
Você disse que o universo da pecuária carece de dados. Isso é uma percpeção ou algum dado concreto?
Nós temos hoje, dentro da escola de consultoria, alguns projetos que vão a campo para mensurar dados referentes ao uso de informação, como o Confina Brasil e o Circuito Cria. Uma das principais ferramentas que o pessoal cita é o WhatsApp. No caso do Circuito Cria, o projeto está mensurando as atividades de cria e recria dentro das propriedades. Ano passado foi o primeiro ano em que o projeto saiu e houve a constatação de que, às vezes, os indicadores de mortalidade são difíceis de se ter porque o pecuarista não quer divulgar, ou a propriedade é muito extensa para se computar esses dados, ou questões com a própria balança. Nós temos um dado de que, hoje, apenas 20% das fazendas no Brasil de pecuária de corte possuem balança. Como você vai saber se o desempenho do seu sistema produtivo está sendo funcional se você não consegue medir a mais básica informação que é o ganho de peso? E aí, quem não mensura não sabe qual que é o seu custo, não consegue determinar bem o momento adequado de compra e venda de insumos e isso dificulta todo o gerenciamento da operação.
Isso tem algum fator cultural?
Nós acreditamos que sim. Por muitos anos, a atividade da pecuária, principalmente pensando na cria, esteve relacionada com a abertura de áreas e com a povoação de regiões. Então, quando nós vamos para a questão de áreas de fronteiras agrícolas, que hoje o processo produtivo, tem duas realidades no Brasil: as áreas consolidadas a centro-sul e as áreas em expansão a centro-norte. E, mesmo nas áreas consolidadas, ainda há essa dificuldade. Quando nós passamos por esse cenário de abertura marginal da atividade pecuária, nós temos um cenário onde o pessoal não usa ou carece de marcar corretamente as informações.
Existe uma regionalização neste uso da informação da pecuária?
Essa regionalização existe e começa, primeiro, se a gente for parar comparar com o acesso a satélite. Nos dados com relação à área que consegue receber sinal telefônico, quando a gente vai a Centro-Norte do Brasil, há uma dificuldade maior. E aí pode parecer que não, mas é uma coisa que faz diferença para poder se monitorar. Então, você tem que sair hoje da questão do caderninho e passar a usar inteligência computacional. Não falo nem artificial para mensuração. Há, sim, essa regionalização, a gente vê em algumas regiões, principalmente porque a atividade pecuária não é feita só em confinamento. Quando a gente fala de confinamento, são outros 500, o produtor tem que ter na ponta do lápis os custos dele. Mas na atividade em pastagem, que é o grosso da nossa produção, realmente há essa dificuldade. E quando a gente vai mais a norte do país, a gente percebe que isso também acaba pesando ainda mais.
Por que a agricultura faz mais uso da informação de dados do que a pecuária?
Olha, a questão da agricultura, eu acho que ela teve um precursor que acabou estimulando esse acesso à tecnologia mais precocemente. Que precursor que, na nossa visão, veio? A exportação. Quando a gente pega hoje a questão da exportação de soja, milho, café, nós somos carro-chefe no fornecimento de commodities agrícolas para o mundo. Hoje, a questão da carne bovina está se inserindo nesse mercado. Nós passamos de uma participação de exportação de menos de 15% há 10, 15 anos, para hoje quase 40% de participação da exportação dentro do nosso share de produção. Então, pode parecer que não, mas é um estímulo do mercado à tecnificação. Nosso principal cliente, que é a China, ela exige o quê? Um bovino com até 30 meses. A União Europeia, ela pede rastreabilidade no terço final da vida do bovino. E na agricultura isso veio mais cedo.