
Para o produtor gaúcho, a atenção ao clima tem sido cada vez mais reforçada dentro da propriedade, dado o histórico recente do Estado de uma sequência de estiagens e, no ano passado, uma catástrofe climática. O assunto foi abordado durante o Vitis Aurora, evento realizado na unidade da cooperativa de Pinto Bandeira, na Serra, na última semana, e do Campo e Lavoura da Gaúcha, nesta domingo (18). Agrometeorologista e fundador da Rural Clima, Marco Antônio dos Santos foi o palestrante e o entrevistado que abordou o assunto. Confira trechos.
Como deve ser o tempo para a próxima safra, considerando a cultura da uva na Serra?
A previsão agora é de um clima relativamente bom. Diferentemente do ano passado, quando tivemos chuvas em excesso, neste, as chuvas até vão chegar. Porém, a tendência agora para esse inverno é de que as frentes frias consigam também subir e levar chuvas para as regiões mais ao norte do Brasil. E, com isso, as frentes frias passam mais rapidamente aqui trazendo chuvas. Ou seja, não vai faltar chuva, mas também não vai vir em excesso, o que é um bom sinal, tanto para as culturas de frutíferas, como também para as culturas de inverno aqui no Rio Grande do Sul, que daqui a pouco começam os plantios do trigo, da aveia. E falando em temperatura, também tem tudo para ser um ano relativamente bom, porque se vocês estão observando, toda entrada de uma frente fria depois da chuva vem um frio, isso é a entrada da massa de ar polar. Outro ponto positivo é com relação à primavera. Quando a gente pensa nas culturas de inverno, como trigo e aveia, a grande preocupação do produtor é a colheita, também com excesso de chuvas. No entanto, os modelos já estão sinalizando que há uma tendência das chuvas chegarem mais cedo no Cerrado, ou seja, regiões como Sudeste e Centro-Oeste já devem receber as primeiras chuvas lá no final de agosto e início de setembro. E o que tem a ver isso com a gente aqui, com vocês aqui? Se as chuvas chegam mais cedo lá na região centro-norte do Brasil, não chove tanto aqui na época da primavera.
A geada tardia traz um risco muito grande para a produção de inverno. O que está no radar neste ano com relação às geadas?
A probabilidade de se ocorrer geadas neste ano é maior do que quando comparado a 2023 e 2024, que estavam sob o efeito do El Niño. O El Niño tem característica de barrar as massas de ar mais ao sul do continente, ou seja, quando ocorre alguma geada, é muito mais na região da Campanha do que propriamente no sul do Brasil. Como neste ano, por ter um clima mais neutro e entradas mais frequentes de massa de ar polar, a probabilidade de ocorrer geadas é enorme. O problema é saber exatamente quando, porque a gente só consegue prever uma geada, de fato, com, no máximo, uma semana de antecedência. Antes disso são só prognósticos. E, por enquanto, o que a gente está vendo é que essas geadas estão muito mais concentradas no inverno do que na primavera.
Olhando para o prognóstico a longo prazo, os modelos climáticos apontam para a ocorrência de La Niña no próximo verão. O que, para os gaúchos, sempre dá um calafrio, porque influencia em um regime de chuva mais escasso. Corre-se risco, de fato, de ter La Niña no próximo verão?
Ainda é muito cedo ainda para fazer esse prognóstico. Qualquer coisa que eu fale agora, o grau de erro é gigantesco. No entanto, o que dá para ser falado é que existe uma possibilidade muito grande dessa manutenção na neutralidade, pelo menos até a primavera. Porém, algumas rodadas de modelos começam a sinalizar uma possibilidade da volta do La Niña para a safra 2025/2026. Caso se confirme, viria de novo mais no final do ano. Porém, é só um prognóstico.
Em meio às mudanças climáticas, o que o produtor pode fazer, já que a gente não consegue controlar nem o clima, nem o tempo?
As mudanças climáticas nada mais são do que um novo padrão. O que a gente está vendo é que esse novo padrão está potencializando os extremos, então, quando é frio, é frio demais, quando é chuva, é chuva demais, quando é seca, é seca demais e, no calor, as temperaturas são extremamente elevadas. E o produtor tem que estar ciente de que essas mudanças climáticas estão ocorrendo e vão ocorrer nos próximos anos. O que ele tem que fazer é a lição de casa, é manter a sua planta bem nutrida, usar produtos eficientes e não economizar no uso, fazer bons perfis de solo, manter o solo com boa palhada.
As mudanças climáticas tornaram a vida do meteorologista e do agrometeorologista mais difícil ainda?
Temos de olhar a previsão do tempo com outros olhos. Porque, apesar de ter ferramentas melhores, os modelos muitas vezes demoram para captar todas essas mudanças, esse novo padrão. Então, muitas vezes, temos que olhar além das previsões, além dos gráficos, além dos mapas, para entender o cenário e aí transmitir de uma forma mais incisiva ou mais assertiva para os produtores e toda a cadeia do agronegócio, que são os nossos clientes.