
Com o papel de reservar e comercializar a safra de grãos, as empresas cerealistas ganham novos desafios, à medida que a produção avança em volume e qualidade. São questões relacionadas a infraestrutura, logística, armazenagem, futuro da lavoura de soja, reforma tributária e nova formatação do crédito, entre outras. E que pautarão os debates do 2º Congresso Cerealista Brasileiro, de quinta (21) a sábado (23), em Garibaldi, na Serra. Em entrevista ao Campo e Lavoura da Gaúcha neste domingo (17), o presidente da Acebra, Jerônimo Goergen, falou sobre o evento. Confira trechos abaixo e o áudio da entrevista.
Essa é a 2ª edição do congresso. Quais serão os temas prioritários?
Abrimos o evento (a 1ª edição foi no ano passado, em Foz do Iguaçu) para que todos que convergem com o cerealista possam fazer parte. E debateremos os cenários futuros de comercialização. É também um ano muito importante porque estamos comemorando cem anos do plantio da soja no Brasil. Um dos painéis é sobre o futuro do grão no mercado global. Há temas como a União Europeia e questões de biotecnologia com relação a outros países que têm colocado barreiras comerciais, como a China. Também tem o marco dos 20 anos da formalização da biotecnologia. O Rio Grande do Sul foi palco desses momentos, e por essa razão, decidimos fazer aqui no Estado.
Como atender às demandas que têm vindo de mercados como a UE, com regras por vezes diferentes das do Brasil?
Formamos há duas semanas, com outras entidades, uma aliança para discutir o tema internacional, com relação à China, que já nos coloca a barreira, tem essa questão da União Europeia. Ganhamos um ano de paz (a vigência da lei europeia foi adiada para 30 de dezembro de 2025), mas não dá para esperar um ano para começar a se organizar. Com a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) e a Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove) estamos criando uma plataforma. Para orientar e preparar para tudo o que for imposição se torne renda, e não uma simples penalidade, se não cumprirmos a regra.
As exigências são também uma oportunidade de renda?
Tenho o entendimento de que o tempo em que subsídio era a barreira comercial já foi. Hoje, o tema ESG (sigla, em inglês, para práticas ambientais, sociais e de governança), o sanitário são utilizados muito pelo crescimento, a capacidade de produção que o Brasil. E eu, no papel de representante das empresas que adquirem o produto do mercado produtor, tenho conduzido de forma que não adianta brigar. Também sou contra, é um exagero da UE, temos regras claras aqui que o mundo inteiro não tem, mas eles estão falando de negócio. Entendo que simplesmente brigar e mobilizar para ganhar um ano, e depois de novo para tentar mais um...mais cedo ou mais tarde, as regras do mercado serão impostas. Buscamos orientar o associado e eles, o cliente, para que tentem fazer a adequação. Se chega simplesmente na última hora e não se organizou, poderemos ser punidos com eventuais diminuição de preço, de renda. Nesse tema de ESG, se tivermos uma boa estratégia, até mesmo a questão do crédito melhora. Temos um acordo que, cumpridas as regras desta plataforma, quando começarmos a operar, teremos sinais de redução de custo do dinheiro por termos regras que o mercado internacional vai olhar. Considero que se nos organizarmos e entendermos o que o mundo quer consumir e impor o preço pela nossa organização, é muito melhor do que simplesmente imaginarmos que o mundo depende de nós e que venham comprar. Dá para melhorar a renda, e é nesse sentido que estamos trabalhando com a plataforma, que deve entrar em operação ao longo de 2025.
O que exatamente será essa plataforma?
Boa parte das regras já temos condições de atender, então estamos unificando tudo. De forma que o produtor recebe a condição de acessar a plataforma, coloca os dados, sem nenhuma imposição, atendendo à demanda, e a Acebra (Associação das Empresas Cerealistas do Brasil) vira uma espécie de certificadora. Quando vão comprar o produto das nossas empresas, as tradings saberão as exigências impostas por eventuais mercados, se estão atendidas. E quando o produtor não atender, vamos orientá-lo para que possa avançar. Independentemente da UE, nossas empresas estarão preparadas para qualquer exigência dentro do razoável. A Acebra será uma certificadora, e tentaremos negociar preços melhores aos produtores.
Qual o panorama das cerealistas em relação aos efeitos da catástrofe climática do RS?
O momento é muito delicado. Nos últimos três anos, com duas secas fortíssimas e agora o episódio da chuva, tem um cenário ainda mais complicado no Rio Grande do Sul. O tema do endividamento é real, e a mudança do crédito fez com que o limite esgotado nos bancos fosse sendo jogado para o setor privado. Essa é uma realidade, as empresas estão buscando fazer os ajustes com o cliente, mas tudo é recurso privado, que vem mais caro ainda. No momento da chuva, tivemos uma grande oportunidade de o governo entender que o Rio Grande do Sul precisava realmente de uma reorganização do seu endividamento. Acho até que foi uma ideia que poderia contemplar isso, de alongar e transformar tudo em um única dívida (a linha de capital de giro do BNDES, com recursos do Fundo Social), mas não se consolidou. E, com os juros como estão, é algo que vai aumentar a bola de neve. Não tem menor condição da rentabilidade, mesmo com uma safra cheia, essa é uma preocupação.
Veja a íntegra da entrevista e do programa: