
Enquanto o resto do mundo senta à mesa para negociar cessar-fogo, energia limpa e novas regras de comércio, o Brasil segue emperrado num ciclo de revanche e desencontro. A Medida Provisória que substituía o aumento do IOF – e que poderia garantir 17 bilhões de reais extras à União em 2026 – foi derrubada na Câmara por 251 votos a 193. A derrota, simbólica e fiscal, fez o presidente Lula reagir com o que ele próprio sabe que não funciona: tesoura na mão e sangue quente na cabeça. Sugestão da sempre muito calma ministra Gleisi Hoffmann.
Vieram então as exonerações. Um “pente-fino”, como definiu a ministra Gleisi, nos cargos do Centrão espalhados por estatais e órgãos federais. Foram atingidos nomes do PP, PSD, MDB e União Brasil, em estruturas como a Caixa, o DNIT, o Iphan e a Codevasf, os mesmos espaços que, meses atrás, o governo havia entregue em troca de apoio parlamentar. A linha de corte, segundo o Planalto, separaria quem é governo de quem não é.
Mas o resultado é o mesmo de sempre: a base fica mais hostil, a articulação mais tensa e a governabilidade mais curta. É a velha política de gabinete, feita no impulso, com o fígado no lugar da cabeça. Lula, que um dia foi o presidente do diálogo, parece hoje confundir firmeza com teimosia e articulação com revide. Não que a distribuição de carguinhos nas estatais seja moralmente correta, ela não é. Mas o movimento de cortes não vem do afã de eliminar os gargalos da corrupção, mas sim de trocar os comandantes destes gargalos.
A MP rejeitada buscava tributar grandes fundos e offshores, tentando substituir o aumento do IOF que incidiria sobre o consumo. Ou seja, em tese, a intenção era boa mas o método, desastroso. A queda do texto abre um rombo de R$ 17 bilhões no orçamento e força o Ministério da Fazenda a cortar investimentos e travar emendas. No fim das contas, como sempre, o ajuste recai sobre quem não tem lobby em Brasília: o contribuinte.
Mas a falta de diálogo não é exclusividade do governo. Do outro lado do tabuleiro, a oposição também se sabota. Ciro Nogueira, presidente do PP, resolveu declarar o óbvio em uma entrevista ao dizer que Eduardo Bolsonaro causou “um prejuízo gigantesco à direita” por sua atuação nos Estados Unidos. O filho do ex-presidente respondeu nas redes, com ofensa medida e vitimização patriótica. É o tipo de diálogo que caberia num grupo de WhatsApp, não entre líderes de um campo político que pretende voltar ao poder.
De um lado, então, temos um governo que pune em vez de conversar. Do outro, uma oposição que briga consigo mesma e não conversa com ninguém. No meio, um país exausto, que já entendeu que governabilidade não se compra com cargos, mas se constrói com confiança.
Enquanto o mundo negocia paz, o Brasil insiste numa guerra fria, doméstica e inútil, em que todo mundo sai ferido e ninguém governa. E a conta, claro, quem paga somos nós.




