
Mais uma vez, o Rio Grande do Sul acorda debaixo d’água.
As imagens se repetem como se o tempo tivesse congelado no pior frame: ruas que viram rios, carros boiando, casas invadidas pela água, gente empilhando sacolas na porta de casa para tentar conter o inevitável. Gente desabrigada. Gente sem luz. Gente sem chão.
É curioso — ou desesperador — como passamos a chamar de "evento extremo" aquilo que deixou de ser exceção. A verdade é que não há nada de extremo numa tragédia que se repete a cada quatro ou cinco meses. O que há, mesmo, é uma normalização da catástrofe. Um ritual coletivo de luto, solidariedade e reconstrução que começa a ser ensaiado antes mesmo da sirene tocar.
Enquanto a Defesa Civil corre para dar conta do possível e do impossível, o governo do Estado segue preso ao seu próprio labirinto de burocracias, estudos técnicos e promessas de médio prazo. As pessoas têm a sensação de que o Palácio Piratini ainda acredita que tudo isso é passageiro e que o céu vai abrir sozinho, sem exigir dele nenhuma responsabilidade a mais. É como se estivesse esperando que a chuva perca a paciência antes dele.
Em entrevista ao Timeline, o governador Eduardo Leite disse que o acumulado das chuvas pode chegar a 450 milímetros em sete dias, o que torna impossível não haver transtornos. E é fato que a quantidade de água é realmente elevada, mas nós deveríamos estar mais tranquilos agora, um ano depois do pesadelo do ano passado, e não estamos.
A resposta precisa vir da política pública, da prevenção, da adaptação da infraestrutura, da coragem de fazer o que precisa ser feito. A água não pede mais licença para entrar e o governo continua pedindo tempo, mas o tempo acabou.
Não há governo que consiga impedir a chuva, é claro, mas deveria haver governo que conseguisse impedir que tudo desabe a cada vez que chova. Enquanto o as autoridades insistirem em tratar cada tragédia como exceção, a população seguirá lidando com elas como rotina.