
No Brasil, até a assinatura de alguém com demência vale na Justiça, desde que assine do lado certo.
A deputada federal Daniela Carneiro protocolou no STF um pedido de afastamento de Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF. Segundo uma perícia, a assinatura que sustentou o acordo judicial que manteve Ednaldo no cargo é falsa. A assinatura atribuída a Coronel Nunes, ex-presidente da CBF, de 86 anos, foi considerada incompatível com a caligrafia dele. E mais grave: um laudo médico aponta que Nunes apresenta déficit cognitivo severo desde 2023. Ou seja, além de uma possível falsificação, há dúvidas reais sobre a capacidade dele de assinar qualquer coisa, quanto mais um acordo que definiu o comando do futebol brasileiro.
Esse mesmo acordo foi homologado pelo Supremo Tribunal Federal. E quem era o relator? Gilmar Mendes. O mesmo Gilmar Mendes cujo instituto, o IDP, firmou um contrato milionário com a própria CBF para administrar a área de cursos da entidade, a chamada CBF Academy. O IDP foi fundado por ele e hoje é comandado por seu filho. Pelo contrato, 84% da receita da Academy vai para o instituto. Os outros 16%, para a CBF. E a ética com zero.
É uma mistura tão confortável quanto perigosa. Um contrato milionário entre o filho de um ministro do STF e uma entidade que está sendo julgada por esse mesmo ministro. Um tipo de conflito de interesse que, em qualquer lugar minimamente sério, geraria ao menos um pedido de explicação. Aqui, gera silêncio e intimidação.
Enquanto isso, em outro front, a Câmara aprovou um projeto que aumenta o número de deputados federais de 513 para 531. O custo estimado da brincadeira é de 64 milhões de reais por ano. Num país que está lidando com as consequências do escândalo do INSS, onde mais de 700 mil aposentados foram lesados com descontos indevidos que chegam a mais de R$ 6 bilhões, a resposta da classe política é contratar mais deputados.
É como se Brasília dissesse, com todas as letras: o sistema não está falido, ele está apenas caro demais para funcionar sem os meus privilégios.
CBF e Congresso, cada um à sua maneira, seguem operando no modo automático, garantindo poder, protegendo os seus e empurrando a conta para quem assiste de fora. E nós, como sempre, seguimos do lado de cá, vendo tudo acontecer da arquibancada. Sem apito, sem VAR, e sem direito de entrar em campo.