
Tenho visto, com frequência, revelação da gravidez ao marido a partir de gravação nas redes sociais.
Pensava que fosse armação e encenação para ganhar likes e atrair seguidores, até me deparar com tantos posts que já assumo que virou uma tendência de relacionamento. Assim como a fumaça azul ou rosa do chá revelação.
Longe de condenar a prática — não me sinto bem no papel de juiz —, eu gostaria de meditar a respeito da natureza dessa superexposição.
Ela é saudável?
O parceiro é simplesmente escancarado na internet. Aparece com aquela cara de bocó, sem ter como se preparar.
Balbucia, tonteado:
— É verdade? É mentira?
Jura que seu par está blefando.
Por fim, a esposa ou namorada mostra a caneta de farmácia com o desenho de positivo.
Talvez seja um teste para definir o grau de comprometimento do outro na relação, talvez seja uma forma de condicionar favoravelmente o comportamento, talvez seja um registro cruel e sem retratação de como a pessoa vai lidar com a notícia, para prevenir a tradicional insensibilidade masculina.
Francamente, não considero a pegadinha engraçada. Não se brinca com as esperanças ou com as expectativas alheias.
A principal questão é que ninguém sabe como vai reagir diante do anúncio de um filho.
Eu provavelmente soltei um grito afônico nas minhas duas experiências. Se tivessem me gravado, apesar de estar realizado por dentro, eu seria cancelado pela minha aparência atarantada. Por fora, não duvido que iria parecer contrariado.
Não apresentei um sorriso, mas uma careta. Trata-se de uma emoção tamanha que desconcerta qualquer um.
É como filmar alguém dormindo — bonito não será.
Descobrir-se pai é o equivalente a entrar num transe. Estará de corpo presente e alma aérea. Pois a informação é absolutamente pessoal. Mexe com as estruturas.
Quem recebe o prognóstico pode ficar assustado, empolgado, angustiado, otimista, tudo ao mesmo tempo.
A vida se transforma para sempre. É uma responsabilidade descomunal cuidar de um filho, abrir espaço para seu crescimento na realidade e nos sonhos.
A atitude incipiente é protetora e amedrontada: terei como sustentar?
Há ainda o zelo pelo psicológico do casal, uma preocupação salutar com o início perigoso da gestação em meio às suscetibilidades públicas.
Os três meses do começo são os mais vulneráveis e críticos, com a possibilidade de aborto espontâneo ou malformações causadas por deficiência nutricional ou doenças maternas. Não dá para sair espalhando ao mundo, melhor é ter tranquilidade e resguardo.
Acredito que a gravidez, pelo menos na primeira vez em que se conta, deveria ser um segredo feliz do casal. Exigiria conversa a sós, muito afeto, olho no olho, dando lugar para a sinceridade. Sem câmera. Sem pressão. Sem julgamento. Para digerir lentamente a mudança, para projetar calmamente um futuro.
No meu entendimento, é um momento único, que merece acontecer sem o palco dos comentários e das interações, distante de uma plateia que é capaz de se intrometer num assunto delicado e reservado.
Representa o encontro fundador de uma família: os pais e o bebê no ventre. Depende de privacidade.




