
Quando uma mãe me diz que seu filho tem deficiência intelectual, eu apenas respondo:
— Quem não tem?
Quem não enfrenta lapsos de memória, de coordenação, de destreza diariamente? Quem não erra as perguntas mais óbvias e se embaraça com as informações mais básicas?
Quem, hoje, não arca com impasses na comunicação com os outros e prefere se isolar a se expor a alguma gafe? Quem não foge de aglomerações, ainda que festivas? Quem não fica no celular, imerso nas redes sociais?
Quem não tem problemas de adaptação?
Quem não se encontra fora da sua idade, já que a experiência é que alinha nosso tempo biológico com nosso tempo emocional?
Há pessoas que não saem do lugar, não têm iniciativa e se acomodam nas falhas — e são avaliadas como saudáveis.
Há pessoas que mentem e enganam — e são identificadas como plenamente aptas.
Uma mãe jamais deve ser julgada por “passar a mão na cabeça” do filho, pois seu filho precisa justamente disto: de alguém passando a mão na sua cabeça, propondo carinho e aceitação.
Jamais ofenda uma mãe afirmando que ela faz vista grossa. Ela se mostra acessível e atenta. Só faz vista quem está longe.
Jamais diminua uma mãe alegando que ela não sabe disciplinar sua criança. O entendimento é o verdadeiro incentivo. Se você não é compreendido, você para de tentar.
Peço que as famílias de meninos e meninas com o estigma de “disfuncionais” não se desesperem. Rótulos não duram, representam o medo do diferente, quando o normal é ser diferente.
O que importa é o coração. O que importa é o coração brilhar. Ele manda em nossa vida desde a origem.
Eu temo deficiências de caráter: a ingratidão, o egoísmo da indiferença, a exploração dos bem-intencionados, a deslealdade.
Esquecer uma lição da escola na hora da prova nada é perto de esquecer quem esteve ao nosso lado no decorrer dos anos.
O coração é o primeiro órgão do embrião humano, antes de o cérebro estar totalmente estruturado. Ou seja: o coração é o nosso cérebro fundador. Por onde começamos a pensar a existência, a legitimar a nossa presença.
O seu desenvolvimento principia entre o 18º e o 22º dia após a fecundação, e ele bate pela primeira vez por volta da quinta semana de gestação. Ainda não possui quatro câmaras, mas está lá, assemelhando-se a um tubo cardíaco primitivo, pulsando, fornecendo sangue e oxigênio.
Tanto que ele surge originalmente na parte superior do corpo. A região em que o coração se forma está próxima à cabeça do embrião (muito curvado e pequeno). À medida que o embrião cresce e se alonga, os órgãos descem para suas posições definitivas.
O coração parece estar inicialmente mais acima, e depois vai ocupando seu espaço no tórax.
É ele que nos dá a notícia: estamos vivos. É ele que nos apresenta ao mundo. O batimento é o nosso tambor inaugural.
Na mente, haverá eternamente a sombra do coração. Por quem ele acelera? Por quem ele se emociona?
Ele é o primeiro a nascer, e o último a ir embora. Você é considerado morto quando seu cérebro cessa, naquilo que conhecemos como morte encefálica. Mas repare: mesmo quando a atividade cerebral termina, o coração ainda pode resistir com a ajuda de aparelhos. Ele nunca desiste.